segunda-feira, 16 de julho de 2018

Meu ódio será a tua herança

    Título curioso para um texto no boletim de uma comunidade cristã, evangélica, reformada… É o título de um filme de faroeste de 1.969 que assisti em algum momento da minha adolescência. Curiosamente, o título não foi esquecido, mas a história sim.

    E o título me veio à cabeça ao ler o texto do Paul e Raphael Freston na última edição da Ultimato, “a ética do ódio, as fake news e a idoneidade cristã”.  Logo no início, os autores compartilham o desconforto que foi ouvir de uma pessoa cristã, líder, que tinha (isto é, exercitava, cultivava, como parte de sua vida) ódio - no caso, do ex-presidente Lula. Na verdade, não importa o objeto do ódio - Lula, Bolsonaro, Marina da Silva, o vizinho, o tomador de conta. Conta o fato do ódio como parte integrante da vida, como motor do ponto de vista, como base no relacionamento.

    Posso atirar a primeira pedra em tal irmã? Posso afirmar que nunca pensei ou disse algo semelhante? Certamente a resposta é não para essas perguntas.

    Posso então, por uma questão de coerência pessoal, permitir que cresça em mim o sentimento, a ideação, a fantasia do ódio por um desafeto, por um personagem político, por alguém? Certamente não.

    Reconhecer que o pecado do outro é compartilhado por mim não me exime de denunciá-lo em mim e no outro; não me exime de confessá-lo e de admoestar o outro.

    Uma frase famosa entre os crentes é “amo você mas odeio o pecado que habita em seu interior”. Dito curioso, com uma aparência de piedade, assim como as sugestões satânicas são: simulacros de piedade, de virtude, de obediência às Escrituras. Estas têm uma preocupação especial em contrabalançar as emoções mais pessoais e verdadeiras com o imperativo ético de agir para com o próximo de igual modo ao que Deus age conosco.

    Odiar é fácil, assim como destruir. Castelos de areia levam tempos para serem construídos, mas uma única onda os põe abaixo. Relacionamentos, reputações, articulações, ações sociais, ensino, espiritualidade sadia… Facilmente destruídas, arduamente construídas. Construir dá trabalho, investir em relacionamentos saudáveis custa nosso amor próprio, criar uma boa reputação consome tempo, ter ações sociais compromete disponibilidade e sobra financeira, investir na espiritualidade saudável causa dor e arrependimento pelos pecados.

    Há uma semana foi discutida a relação entre fé cristã e desesperança política (assista o vídeo). Esta é fruto também do ódio dirigido ao nada. O ódio, mesmo que nascido de situação supostamente justa, nunca constrói. O que constrói é a esperança, é o sonho, é a certeza de estar esperando contra a esperança, é a convicção de se agir corretamente para que os frutos sejam reais em duzentos anos e não no nosso tempo.

    Nosso Senhor não nos ordenou a deixar ódio pelo mal como herança para as gerações futuras. Mandou que construíssemos, mesmo com perda pessoal. Estabeleceu que nosso legado seja de serviço desinteressado, mesmo que àquele que, aos nossos olhos, nada mereça. O amor dEle é nossa herança, nosso destino, nosso sonho, nosso motor, a base dos nossos relacionamentos. Não o ódio.

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